quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O Que é Radioamadorismo?

Embora possa parecer estranho, costumo dizer que a maior parte dos Radioamadores brasileiros não sabe definir corretamente o que é o nosso hobby.
Quando falam de Radioamadorismo, e diante de várias colocações expostas por diversos
colegas, como por exemplo:

“o CW é obsoleto, não serve pra nada e não deveria mais ser obrigatório nos exames”
“pra que exigir radioeletricidade nos exames para radioamador?”
“não faço contatos com quem usa equipamentos QRP porque a recepção fica horrível”
“a gente gasta um dinheiro enorme no rádio e se decepciona”
“quem gasta dinheiro com rádio é porque realmente gosta do hobby”
“ficar na frente do rádio ouvindo aquela estática toda”
“enquanto que no micro é só clicar no mouse e se conversa com o mundo todo”

Diante disso, temos que relembrar a todos o que realmente é Radioamadorismo:

- A grande maioria dos radioamadores se esqueceu do que é nossa essência, nosso objetivo : a radioexperimentação, ou seja, experimentação técnica, construção de equipamentos, desenvolvimento, estudo e construção de antenas, estudos sobre a propagação e novas faixas de operação, aprimoramento em contatos a longa distância (DX) e operação de satélites.

- Por definição legal, o que é Radioamadorismo:

“O Serviço de Radioamador é o serviço de telecomunicações de interesse restrito, destinado ao treinamento próprio, intercomunicação e investigações técnicas, levadas a efeito por amadores, devidamente autorizados, interessados na radiotécnica unicamente a título pessoal e que não visem qualquer objetivo pecuniário ou comercial.”

- Foi para esse objetivo (radioexperimentação) que o radioamadorismo foi criado, e não “uma forma de conversar com outras pessoas”.

- Radioamadorismo não é simplesmente “comprar uma equipamento pronto” apenas com o objetivo de “conversar sobre assuntos triviais da vida”, pois esse é o objetivo de outro serviço, chamado “faixa do cidadão”. Ou melhor ainda: telefone celular e internet !

- Lamentavelmente muitas pessoas ingressam no Radioamadorismo confundindo estes objetivos, e às vezes aqui permanecem por anos, confundindo nossa atividade, destinada à radioexperimentação, como “uma forma de bater papo”.

- Por mais íntegros e bem intencionados que possam ser estes colegas, pelo fato de não terem conhecimentos técnicos apenas conseguem conversar com outros “apertadores de botões”, pois não conseguem acompanhar conversas de cunho técnico, com assuntos verdadeiramente pertinentes ao Radioamadorismo. Como isso, o que acontece é que com o decorrer do tempo estes “apertadores de botão” se desiludem, pois os “assuntos” se esgotam ; em contrapartida, os verdadeiros radioamadores jamais perdem o interesse, pois a pesquisa e o desenvolvimento sempre evoluem a cada dia junto com o radioamadorismo, cuja fronteira está hoje nas faixas de micro-ondas, onde já estão sendo feitos experimentos acima de 145 GHz, em modos de reflexão lunar, reflexão de meteoros, entre outros, onde ainda se investiga como a propagação se comporta nessas freqüências ultra elevadas.

- Vejo na faixa e nas diversas listas de discussão na internet verdadeiros Radioamadores que eram contemporâneos dos equipamentos valvulados, mas que hoje estão aqui operando satélites, montando transversores, receptores SDR, conversores e pré-amplificadores com Hempfets. Afinal de contas, o
Radioamadorismo é uma ciência em evolução, e não uma simples forma de bate papo.

- Se o Radioamadorismo não fosse algo importante, a NASA não incentivaria seus astronautas a manterem contatos experimentais com Radioamadores em suas viagens, num ambiente em que qualquer peso adicional custa milhões de dólares. Pelo que sei, jamais disponibilizaram a possibilidade de contatos dos astronautas
com pessoas comuns (exceto escolas !) pela internet para “bate papo”, o que sairia muito mais barato, fora a praticidade. E o que dizer dos satélites, unicamente destinados aos contatos entre radioamadores ? Pode acreditar, não custaram pouco...
Pelo que vejo, as pessoas que “entram” no Radioamadorismo tomam uma entre duas direções:

A - Tornam-se verdadeiros radioamadores, e praticando, entre outras, as seguintes modalidades:

- CW (onde com pouca potência se faz contatos com o mundo todo)
- AM (onde quase todos são montadores e os assuntos sempre técnicos)
- QRP (atividade extremamente ligada à experimentação técnica)
- QRO quase sempre praticado com montagens caseiras
- DX (não deixa de ser uma forma de experimentação)
- VHF-DX e UHF-DX (onde temos um excelente campo para estudos)
- Modos Digitais (onde também com pouca potência se vai muito longe)
- Reflexão Lunar / Reflexão por Meteoritos (experimentação pura)
- Operação de Satélites (experimentação pura)
- Pesquisas em faixas acima de 2,4 GHz ( lamentavelmente praticado por poucos)

A experiência mostra que quem opera nessas modalidades fica cada vez mais “apegado” ao Radioamadorismo, aprimorando-se a cada dia. Dificilmente os veremos ficar “desgostosos” ou “perder o interesse” pelo hobby.

B - Ou tornam-se verdadeiros “apertadores de botão”, operando apenas com equipamentos de fabricação comercial nas seguintes modalidades:

- VHF / UHF (apenas via repetidores)
- SSB (apenas com assuntos banais, mas jamais técnicos)

Com o passar do tempo, a tendência de quem opera nesses modos é se afastar ou até mesmo se desligar do radioamadorismo, pois as conversas alheias a assuntos relacionados a nossa essência se tornam repetitivas e enfadonhas. Em regra esses “colegas” partem para outro hobby. Os que permanecem com os equipamentos passam a praticar o “radio vandalismo”, ou seja, tentam descontar nos demais a frustração que receberam com o rádio.

Esse fenômeno não ocorre apenas aqui no Brasil, mas sim no mundo todo. Tenho visto isso com freqüência em outros lugares, e quando conversamos com colegas estrangeiros verificamos que o problema não é apenas doméstico, mas mundial. Infelizmente !

Concordo que existem falhas na sistemática de exames de ingresso e promoção de classes, e discutir este assunto pode levar vários anos, mas de nada adiantará se não houver primeiro a conscientização sobre o que realmente é o nosso hobby.

Acredito que muita coisa deve ser mudada, mas minha opinião é que o neófito deve ser alertado sobre o quê realmente é o radioamadorismo, para que não confunda os objetivos de nosso serviço, e da mesma forma incentivado a progredir de classe.

Mas não acredito que a saída seja a facilitação dos exames. Cito como exemplo a forma como eram feitos os exames nos países da Europa oriental, onde o candidato, após comprovar as escuta de radioamadores por um ano com cartões QSL, tinha que
demonstrar a uma banca examinadora como funcionava um projeto de transmissor que ele mesmo deveria projetar !

Uma vez corujei via Echolink de uma rodada num repetidor russo, e fiquei pasmo em ouvir uma excelente explanação sobre pré-amplificadores de baixo ruído, que era o assunto que estava sendo discutido. Vai demorar muito, mas muito mesmo pra ouvirmos conversas no mesmo nível aqui em nossos repetidores...

Também acredito ser necessária a implantação de exames periódicos, pois temos em nosso meio muitos “tralhas” de classe A que nunca ouviram uma única letra em CW e que sequer sabem diferenciar um transistor de uma válvula, remanescentes da época em que o “apadrinhamento” era regra nos exames. Afinal, quem é verdadeiramente vocacionado não tem nada a temer. Acredito que isso iria eliminar uma grande parte de nossas mazelas.

Quanto ao “argumento” de que o Radioamadorismo “está acabando” ou “vai morrer”, discordo, pois não se compara quantidade com qualidade. Cito como exemplos os colegas brasileiros que estão publicando páginas técnicas na internet, desenvolvendo experiências com novas tecnologias (SDR, SI570, DDS) para o radioamadorismo, desenvolvendo novos projetos de antenas, instalando beacons para facilitar o estudo da
propagação, instalando espectrômetros até na Antártida, incentivando DX com a elaboração de novos concursos, participando de DXpedições, realizando experiências em novas faixas, tanto em VLF como em SHF, entre muitas outras atividades. Apenas não vou citar nomes para não cometer injustiças por omissão.
Por esses exemplos de atividades acima citados, cada vez mais praticados por radioexperimentadores brasileiros, acredito que é muito melhor termos “meia dúzia” de verdadeiros Radioamadores do que milhares de “apertadores de botões”.

Volto a relembrar: não se pode falar de Radioamadorismo como se fosse um “simples hobby pra bate-papo”. Quem ainda não se deu conta disso está no lugar errado. E não existe erro maior do que não saber sequer o que somos !

Quanto à polêmica obrigatoriedade da exigência do CW e da radioeletricidade nos exames, acredito até que possam ser substituídos por outras matérias relacionadas à radioexperimentação, mas desde que aplicadas com seriedade e que o exame seja periódico. Nada seria melhor do que o examinador expor um esquema de um transmissor ou de um receptor e exigir que o candidato identificasse cada etapa, ou exigisse que o candidato rascunhasse as dimensões aproximadas de uma antena para uma determinada freqüência. Mas acredito que muito melhor do que isso seria apenas exigir que o candidato à classe inicial escreva cem vezes a seguinte frase na folha de exames:

“Radioamadorismo é radioexperimentação, e não uma simples forma de bate- papo”.

Acreditem, em pouco tempo isso faria uma grande diferença !

Um forte abraço a todos !
                               Adinei, PY2ADN

Nenhum comentário:

Postar um comentário